Quando Eduardo Zenker volta a vender vinhos?

 

Na primeira semana de junho, o mundo de Eduardo Zenker virou de cabeça para baixo. Fiscais do Ministério da Agricultura bateram à sua porta em sua casa no centro de Garibaldi (RS) com uma ordem expedida pela Justiça e interditaram a Arte da Vinha, sua vinícola que funcionava na garagem de sua casa. Artesanalmente, ele produzia garrafas, primeiramente vendidas para amigos, depois para amigos de amigos que ouviram falar bem de suas criações. No máximo, quando o clima vai muito bem, ele tem capacidade para vinificar seis mil garrafas.

No fim do ano passado, ele tinha sido um dos produtores entrevistados pelo Globo Repórter, o que teria deixado seu nome no radar de grandes produtores, que teriam feito a queixa ao governo federal. A partir daí, produzir vinhos  se tornou uma grande incógnita para ele, que corre para começar a produzir em sua propriedade rural em São Rafael, a 17 Km de Garibaldi. Mas Zenker ainda aguarda posicionamento do governo federal. Ele entregou sua resposta em junho, o governo tinha 45 dias para responder, mas até agora nada. Sua expectativa é de que só consiga  vender em 2020.

Zenker é um produtor artesanal de vinhos, com uma coleção de rótulos cujos nomes chamam menos a atenção do que os líquidos. O Suvaco de Anjo, um corte de Pinot Noir vinificado em branco, Chardonnay e Peverella, é um vinho único, diferente de tudo que já degustei Brasil adentro, Mundo afora, sem comparação com nada mesmo, indescritível. O Alter Ego (que, por ter várias facetas, foi apelido assim) é feito de Chardonnay, outro vinho diferente, explosivo.

Sua garagem é onde ele faz seus vinhos, de forma artesanal mesmo: uma adega sem azulejos, uma chave de fenda e um guardanapo de papel para limpar os resíduos grudados no gargalo de um espumante. A produção artesanal não é contemplada pela legislação nacional, o que tem criado problemas para ele e outros setores, como o caso de queijos artesanais de Roberta Sudbrack no Rock in Rio de 2017.  Mais informações sobre o processo de Zenker, pode ler a ótima matéria pelo tanino5: https://medium.com/@tanino5oficial/a-chave-de-fenda-de-eduardo-zenker-6402740ff59

PISANDO EM UVAS: Por que você começou a produzir vinho? O que te chamou a atenção na enologia?
EDUARDO ZENKER: Em 1991 fiz um curso de degustação na antiga Baron De Lantier, foi muito impactante, um imenso mundo  se abriu, não consegui mais sair. DaÍ pra frente passei a dedicar no mínimo 30 minutos por dia de estudo relacionado a vinhos. Em 1999 elaborei minha primeira vinificação.  O que mais me chama a atenção na enologia é que todos os caminhos são válidos. Eu quis trilhar o meu, encontrar a minha direção com o próprio aprendizado.

PISANDO EM UVAS:  Você se recorda de uma garrafa que tenha marcado sua memória e emocione até hoje?
EDUARDO ZENKER: Me recordo de duas garrafas que marcaram a minha memória. Mas o incrível é que somente o momento ficou marcado, não lembro do nome dos vinhos e dos produtores. O primeiro vinho foi um Zinfandel Americano, degustado no curso de sommelier em 2013. Este vinho me remeteu a momentos da minha infância vividas no litoral Gaúcho. Ao beber me transportei para dentro do ônibus que passava vendendo produtos de Santo Antônio da Patrulha. Com puxa puxa e rapadura de melado nas ruas dos litorais Gaúcho. A outra garrafa foi um Cabernet Franc do Loire que provamos no restaurante Chateaubriant em Paris, no segundo encontro Franco Brasileiro em 2016. Ao bebermos o vinho, eu e a Gabi (minha esposa) imediatamente  nos olhamos com a sensação que estávamos bebendo um de nossos vinhos. Realmente foi muito emocionante.  Naquele momento tive certeza de que estava no caminho certo.

PÍSANDO EM UVAS: Você tem referências quando você vinifica?
EDUARDO ZENKER: Não diria referências, mas inspirações. Hoje elas estão entre o Jura, Alsace, Loire, Bourgogne e Champagne… E amanhã quem sabe?

PISANDO EM UVAS: Como está a questão com o Ministério da Agricultura? Já está resolvida? Você fez alguma mudança onde você produz seus vinhos? O que você pretende vinificar?
EDUARDO ZENKER: A questão do Ministério está complicada e ainda não foi resolvida. Para se ter uma ideia eles me deram 20 dias para apresentar a minha defesa, o que foi feito prontamente. Após a minha defesa o Ministério tinha 45 dias para dar a resposta sobre a minha defesa. Os 45 dias venceram em julho e até agora nada. Para a minha legalização devo me enquadrar na lei do vinho colonial. O local de vinificação será em minha propriedade rural, em São Rafael, a 17 Km de Garibaldi. Mas como nada é fácil como parece no Brasil, já faz 3 meses que encaminhei via Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) o pedido de registro de agroindústria familiar. Mas inda não obtive resposta. Até para pedir a ligação da rede elétrica a espera vai ser de 150 dias, isto após a reunião de todos os documentos que vão de prazos em prefeitura e repartições públicas. Infelizmente a safra 2018 é uma grande incógnita.

PISANDOEMUVAS: A Roberta Sudbrack teve um problema no Rock in Rio, ao vender queijos artesanais, em que os pequenos fornecedores tinham dificuldade de atender a todos os requisitos do governo para vender seus produtos. O governo não aceitou a argumentação dela. O seu caso tem algumas semelhanças com o da Roberta. É preciso uma legislação que incorpore o pequeno produtor, seja do vinho, seja de gastronomia? O que é preciso mudar?
EDUARDO ZENKER: Quando amamos o que fazemos corremos o risco de ficarmos fanáticos. O fanatismo leva a cegueira, a cegueira leva a criarmos um mundo que se encaixa naquilo que mais amamos. Por isso acredito que está na hora de colocarmos os pés no chão. Não acredito mais no Estado, ele não tem o menor interesse em mudar as regras. Estou vivenciando isso no  enquadramento na lei do vinho colonial. Aliás, não existe flexibilização: o que existe é somente a disponibilização de assessoria gratuita pela Emater para o cumprimento das regras e, infelizmente, a demanda por isso é maior que a capacidade da entidade. Então, de agora em diante meu conselho para todos que desejam empreender neste país é de reavaliarem os seus projetos e se encaixarem nas exigências absurdas do nosso governo ou de preferência pegar o avião e tocar o seu projeto em outro país decente, o que não é muito difícil de encontrar.

PISANDO EM UVAS: Você vai vinificar e vender a safra 2018?
EDUARDO ZENKER: Acredito que legalmente somente conseguirei vender no ano de 2020, em 2018 não conseguirei me legalizar, talvez em 2019 consiga elaborar a primeira safra legalizada. Como meus vinhos ficam um ano em pipa e meio ano em garrafa (no mínimo), a primeira venda legal só deve acontecer em julho ou agosto de 2020. Imaginem como é manter um negócio por dois anos e meio com despesas de infraestrutura e fornecedores sem ter nenhuma renda, não vai ser fácil. Por isso peço aos amigos que queiram colaborar que entrem em contato pelo email: contato@artedavinha.com.br (a/c Gabi) e para aqueles que queiram maiores informações disponibilizamos o site eduardozenker.com.br 

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