Copa do Mundo em garrafas

Em uma das degustações do evento “Vinhos de Portugal 2018”, Dirceu Vianna, o único Master of Wines da Terra Brasilis, comandou uma prova com seis garrafas da terrinha, três tintos e três fortificados, com safras que relembravam histórias das Copas do Mundo realizadas nos anos em que as uvas foram colhidas e vinificadas.

Cartuxa Reserva 2014

A segunda Copa realizada pelo Brasil em sua história não apenas confirmou a sina de que o país não é campeão quando sedia o evento, como marcou outro recorde histórico negativo: a derrota de 7 a 1 para a Alemanha foi a maior em uma fase final.

Um dos vinhos do amplo portfólio da Fundação Eugenio de Almeida, cujo maior destaque é o Pêra Manca, o Cartuxa Reserva teve sua primeira safra em 1987. Tendo por base as castas Aragonez (Tempranillo em Portugal) e Alicante Bouschet, plantadas nas vinhas mais velhas da Fundação, o vinho estagia durante 15 meses em barricas novas de carvalho francês e 15 meses em garrafa. Os 15 graus de álcool são muito bem contrabalanceados pela acidez e pelos taninos, finos para o Alentejo. Tem bom potencial de envelhecimento.

Quinta do Crasto Vinhas Velhas 2010

A Copa de 2010 teve um histórico confronto entre Alemanha e Inglaterra em uma polêmica oitavas de final, em que o juiz uruguaio Jorge Larrionda, na primeira etapa, quando os alemães venciam por 2 a 1, anulou um gol legal marcado por Frank Lampard. Na jogada, a bola bateu no travessão e caiu dentro do gol de Neuer. A História “compensava” então o erro de 1966, quando os ingleses ganharam a Copa em um erro de arbitragem que legitimou um gol que não tinha entrado.

Vinhedos de mais de 70 anos de diversas castas, com um rendimento de 2000 litros por hectare (no Château Latour, são cinco mil), colheita manual, e 16 meses de afinamento em madeira, sendo 15% americana e 85% francesa, Quinta do Crasto faz um baita vinho, com taninos finos, ótima persistência e com oito anos de vinhos já mostrando aromas secundários. Ainda com bom potencial de envelhecimento. Se o Vinhas Velhas é desse jeito, o Quinta da Ponte e o Maria Tereza devem ser realmente espetaculares.

Cortes de Cima 1998

Zinedine Zidane levantou a Copa, Mario Jorge Zagallo não fez alguns o engolirem, Ronaldo ganhou a bola de ouro mesmo tendo uma convulsão, a Copa foi a primeira a ter 32 seleções.

As últimas garrafas desse alentejano foram buscadas na adega e remetidas para o Brasil para essa prova. Com 70% de Aragonez (Tempranillo) e 30% de Trincadeira, plantadas a 400 metros do nível do mar, esse é um vinho já no auge, com aromas terciários, de champignon, couro, que deverá iniciar seu processo de decadência em breve. Com 20 anos, mostra como Portugal faz bons vinhos também no Alentejo, apesar de os grandes dourienses serem difíceis de serem batidos.

Fortificados

Moscatel de Setúbal 2002, Bacalhôa

Copa do Rivaldo, do Ronaldo, dos jogos de madrugada pelo fuso, da Coreia ficando entre as quatro.

Ao lado do Porto e do Madeira, o Moscatel de Setúbal, que vale uma curta visita de carro a partir de Lisboa, forma a trilogia de fortificados portugueses. A região oferece um solo argilo-calcário com boa presença de areia e influência da brisa atlântica. A uva permitida é a Moscatel de Setúbal, trazida do Egito oito séculos antes de Cristo e conhecida como Moscatel de Alexandria. “Já tomei um 1902 há pouco tempo em Portugal e se mantinha inteiro e delicioso”, disse Dirceu Vianna, ao ser questionado sobre o potencial de envelhecimento do vinho. Pode até quebrar um galho no primeiro terço de um charuto.

Porto Colheita 1974 Real Companhia Velha

A Holanda de Cruyff repetiu a sina dos húngaros em 1954: fez a melhor campanha, encantou torcedores dos quatro cantos, mas perdeu na final para os alemães. O Brasil, sem Pelé, que havia decidido se aposentar, perdeu dos holandeses e ficou entre os quatro.

A Real Companhia Velha tem em suas digitais históricas as do Marquês de Pombal, no século XVIII. Com vinhedos de 80 anos, em solo de xisto, sob o comando de Pedro Reis, nasce um porto ainda vibrante, mas ofuscado pelo vinho da Copa da Inglaterra. A comparação, muitas vezes, é cruel.

Graham´s Vintage 1966

Os ingleses levaram a Copa, o Brasil fez uma de suas piores apresentações, mesmo com Pelé e Garrincha, que, juntos nunca perderam uma partida pela seleção, mas jogaram poucas partidas da competição, cujo destaque foi a seleção portuguesa, comandada por Eusébio.

Nos livros, os especialistas em Porto destacam três safras como gigantescas desde o pós-segunda guerra mundial: 1945, 1963 e 2011. Alguns outros anos são grandes, como 66 e 77. Ao se experimentar esse Graham´s, é impossível não ficar em dúvida e se questionar como um 1963 pode ser melhor que esse. O 66 é um vinho emocionante, de se experimentar, pelo menos, uma vez na vida. Distante dos holofotes, que jogam luz sobre 63, a Graham´s fez um vinho de arrepiar corações, mentes e pele e que custa bem mais barato que os 63 lá fora. Um porto na sua maturidade é uma experiência sensorial tão inesquecível quanto ler pela primeira vez “Grande Sertão Veredas”.

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