Clos de Tart: a paixão pela Bourgogne

Qual o vinho que fez você se apaixonar pela Bourgogne? No meu caso, foi um Clos de Tart 1998, bebido em 2008. Com dez anos de vida, mostrava aromas florais, animais, minerais, de trufas. Na boca, era interminável, tão longo que logo se apontava um defeito: aquele vinho devia ser feito em garrafas Magnum ou double Magnum, assim haveria mais e mais para beber.

Qual o melhor vinho jovem bebido? Também no meu caso foi outro Clos de Tart, dessa vez 2005, bebido com menos de três anos de vida, um infanticídio consentido por um amigo de um vinho soberbo, com taninos de seda envolto em um corpo possante, aromas de violeta com trufas e uma fruta que não terminava. Também vinha com o mesmo defeito: a garrafa tinha apenas 750 mililitros e era compartilhada em cinco.

Ambos foram feitos por Sylvain Pitiot, que assumiu o comando do Domaine em 1996, tendo aí feito sua primeira safra. Estudioso da região, com livros e mapas publicados, dividiu os 7,5 hectares do terroir, o maior grand cru em monopólio da Bourgogne, em seis parcelas, com cada uma propiciando um lado para o grande vinho. Depois da “assemblage” das seis parcelas, o Tart é vinificado em 100% de madeira nova por 18 meses até ser comercializado.

O comando do Domaine mudou há dois anos: Sylvain Pitiot se aposentou e agora trabalha de consultor em alguns projetos sociais pelo mundo, tem viajado para o Tibet. Jacques Devauges, que fazia os vinhos do Domaine Clos de l´Arlot (cujo branco em Nuits Saint Georges despertou a vontade de Frédéric Mugnier de criar o Maréchale branco) assumiu a vinificação. Até agora não fez grandes mudanças, nem alterando a degustação que é feita com exclusivas meia garrafas. Nos tempos de Pitiot, se fazia uma piada dizendo que o Tart era Clos de Tard, se referindo à preferência de Pitiot por colher as uvas mais tarde do que seus vizinhos, em alguns casos uma semana depois do vizinho Clos de Lambraÿs. Agora a data de colheita está igual aos outros. “Não se pode fazer mais essa brincadeira”, sorri Devauges.

As parcelas que serão mescladas para fazer o Clos de Tart 2016

A degustação da safra 2016, em barril, é didática. Começa com a parcela que fica perto da RN 74 ao lado do Bonnes Mares de Bruno Clair. Passa pela parcela mais ao norte em que o Clos fica próxima do solo vermelho de Bonnes Mares, um outro vinho, e vai até o outro lado do muro em que o vizinho é o Lambrays. Daria para fazer seis vinhos diferentes, tais as nuances do terroir. “Seria estupidez, juntos eles criam um vinho único”, destaca. Para um amigo, o Tart é o custo benefício quando o bolso não é fundo o suficiente para se comprar um Romanée-Conti. Alia a potência de um Chambertin com a elegância de um Musigny. Vizinho do Lambraÿs, ele é mais incisivo, mais profundo e mais complexo que o rival de mureta. Nos anos menos solares, como 1998, 2001, 2008, produz vinhos de se perder o fôlego.

O 2016 esbanja fruta, um fim longo e taninos suaves, enquanto o 2015 mostra como é primário, com uma fruta interminável e um leve toque de chocolate. O Domaine, que mantém em repouso por 30 anos até a comercialização, seu Marc de Bourgogne, começou a partir de 2011 a produzir um Fine de Bourgogne, que será vendido apenas em 2041. As quantidades são ínfimas. Encontrá-lo é uma tarefa difícil, o lugar mais apropriado na Bourgogne é na Athaeneum, em Beaune.

Vendido no fim de outubro por 250 milhões de euros para François Pinaud, dono do Château Latour e do Domaine Eugénie (ex-René Engel, em Vosne Romanée), o Tart tem tudo para continuar no seleto grupo dos grandes vinhos da Bourgogne. Só falta ganhar na mega sena para comprar apenas garrafas magnums.

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